sexta-feira, 4 de novembro de 2016
AMOR E PERDÃO - Maria Dolores
A Madalena fora ao túmulo querido
Entre pedras de extremo desconforto...
Levava flores para o Mestre morto,
Tinha o peito magoado e enternecido.
O Sol reaparecia, resplendente,
A névoa da manhã fundia-se no ar,
Na dourada invasão das flamas do Nascente,
Maria estava ali, unicamente,
A fim de estar a sós, recolher-se e chorar.
A desfazer-se em pranto, ela arguía:
- " Por que , por que Senhor?
Tanta saudade e tanta dor?!...
Toda a felicidade que eu sentia
Jaz aqui sepultada...
Transformou-se-me a vida em sombra e nada
No ermo deste pouso derradeiro..."
Nisso,ela viu alguém... Seria um jardineiro?
Um zelador daquele campo santo?
Mas tomada de espanto,
Viu-se à frente do Mestre Nazareno,
O excelso benfeitor ressuscitado,
A envolver-lhe de paz o coração cansado...
Ela gritou: " Senhor !"
Ele disse: " Maria !"
Ela era a expressão da perfeita alegria,
Ele, o perfeito amor.
Madalena ajoelhou-se e quis beijar-lhe os pés...
- " Maria, por quem és " - explicou-se Jesus,
" Não me toques, porquanto,
Não te esperava aqui neste recanto,
E ainda não fui ao Pai revestir-me de luz ..."
Maria, surpreendida,
Indagou em seguida:
- " Senhor, onde estiveste?
Em que jardim celeste
Encontraste o descanso necessário,
Que vem de Deus, nos dons da paz completa?
Perdoa-me, Senhor, a pergunta indiscreta,
Dói-me, porém, pensar na angústia do Calvário,
Revolto-me, padeço, mas não venço
A mágoa de lembrar-te o sacrifício imenso "
Mas Jesus respondeu:
- " Não, Maria, não fui ainda ao Alto,
Nem me elevei sequer um palmo à luz do firmamento,
Quem ama não consegue achar o Céu de um salto...
Ao invés de subir aos Altos Resplendores,
Desci,mas desci muito aos reinos inferiores...
Despertando no túmulo, escutei
Os gritos da aflição de alguém que muito amei
E que muito amo ainda...
Embora visse Além, a Luz sempre mais linda,
Sentia nesse alguém um amado companheiro,
Em crises de tristeza e de loucura...
Fui à sombra abismal para a grande procura
E ao reencontrá-lo amargurado e louco,
A ponto de não mais me reconhecer,
Demorei-me a afagá-lo e, pouco a pouco,
Consegui que ele, enfim, pudesse adormecer..."
- " Senhor " - interrogou a Madalena -
" Quem é o amigo que te fez descer,
Antes de procurar a luz do Pai? "
Mas Jesus replicou, em voz clara e serena:
- " Maria,
Um amigo não esquece a dor de outro amigo que cai...
Antes de me altear à Celeste Alegria,
Ao Sol do mesmo amor a Deus, em que te enlevas,
Vali-me, após a cruz, das grandes horas mudas,
E desci para as trevas,
A fim de aliviar a imensa dor de Judas ".
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